quinta-feira, 26 de abril de 2007

Acto ou Efeito de Pulsar

150 a 170 vezes o teu nome repetido
Nas paredes que nos guardam
Como segredos.

Do batimento do coração – meu,
Drena o sangue - tinta - nas paredes
Como veias.

E a minha respiração é
A turbulência
Taquicardíaca da tempestade lá fora.

Pulsação.

Da minha boca
Como do meu coração
Em sangue irrigado nas paredes
Quantas vezes o teu nome repetido?

150 a 170 por minuto.

Conseguirá o mundo
Nas paredes pintado
Guardar-nos como segredo?

Coração.

Raquel

2 comentários:

Anónimo disse...

Toda esta obra é na minha óptica de pseudo-critico literário, uma monumental analogia entre a pulsação e um amor colossal! Veja-se o título “acto ou efeito de pulsar” e a primeira estrofe "150 a 170 vezes o teu nome repetido"...

Há aqui uma alusão a um ritmo cardíaco aceleradíssimo, enquadrando estes 150/170 batimentos num espaço temporal de um minuto... pese embora a indução ousada que essa era a intenção do escritor!

Qual será então a fonte de tal excitação nervosa dos sentidos, que provoca uma trepidação cardíaca desta monta?
Apenas o substantivo masculino “nome”, que o autor não cita, deixando ainda ao leitor a penumbra de um anonimato solenemente romântico! Só neste pequeno inicio poderemos extrair o néctar de um desejo ardente, flamifero, quase opressor…e por outro lado, cada batimento corresponde a mais uma repetição do nome, como se esse nome fosse a fonte de vida, como se o coração ganha-se a sua vitalidade e força anímica porque aquele nome existe, porque aquele nome está plasmado em si, como uma voz que dá lhe alento e lhe afaga!

“Nas paredes que nos guardam, Como segredos…” Ora há aqui uma complexidade na forma como expuseste a ideia que me enreda a inteligibilidade, pois esta construção é pessoalíssima, de difícil digestão mental para qualquer leitor que se preze intelectualmente humilde.

Pois as paredes que os guardam poderiam ser uma infinidade de coisas, poderá numa interpretação mais simplista e verosímil ser as paredes de uma casa, mas as paredes guardam pessoas como segredos? Isso seria algo de surrealista, mas atenção, um surrealismo a André Breton e não a Dali!
Todavia, nessa complexidade séria de expressão artística, essa ideia é toda ela atendível, como poética, mas num entendimento absolutamente virado para uma personificação das paredes, podemos chegar à conclusão que elas quase tem faculdades humanas, embora não só as pessoas possam guardar, mas guardar como segredos, há um tanto de humano, pois uma coisa, algo que não é capaz de sentir ou pensar também não guardará como segredos pessoas… porém não quero parecer um daqueles altivos pseudo-juristas a dissertar sobre a teoria geral das coisas, quero ser incisivo e para tal deixa-me dizer-te que está bem conseguida, embora essas paredes possam ser as paredes imaginárias de um mundo onirico criado por ti, ou paredes sem natureza corpórea que existem só na imaginação; veja-se o exemplo de uma obra da qual agora não me lembro o nome, em que um jovem pobre, mas deveras belo… que num dia chuvoso quando abordado sobranceiramente pela amante aristocrata que lhe dizia que não o podia beijar em publico, (século XVIII), veio a arranjar solução, encobrindo-os com o guarda chuva desta junto a um beco e lhe disse que as abas daquele guarda-chuva, os guardavam religiosamente com a mesma opacidade de um santo relicário! Ao que ela não resistiu… isto só para vermos que o conceito de paredes que guardam como segredos, congrega um universo de possibilidades imenso.

O batimento do coração, que de facto drena o sangue, mas o teu é drenado pelas paredes, se bem entendo este raciocínio, pois há aqui uma propositada inversão da forma convencional das construções frásicas, porém presumo que este drenar nas paredes como veias é estranho, pois a imagem criada por esta estrofe não sugere na minha óptica algo concreto, não consigo associa-la a nada de concreto, pois não se adivinha qualquer sugestão… é factível desobscurecer a ideia ínsita ao texto, porém eu só consigo encontrar duas hipóteses: uma é o batimento do coração a cor do sangue associado a uma cor vermelha das paredes…
Outra um pouco sanguinária de mais será a seguinte: o sangue drenado nas veias, uma hemorragia pelo meio, sangue pelas paredes…todavia só na primeira ideia consigo dar um encadeamento à ideia primitiva; nesta segunda hipótese haveria um corte violento com a génese do texto.

A respiração turbulenta, qual a origem de uma turbulência respiratória? Será um êxtase carnal? Será só o prazer psíquico de uma lembrança? Por outro lado é a turbulência taquicardíaca, ora isto sugere que é algo de intenso, algo que não se obtêm só com um pensamento, não há qualquer pensamento que por si só gere uma anarquia dos sentidos análoga à que nos apresentas… uma taquicardia representa um batimento cardíaco acima dos 100/min. O que ou é patológico ou resulta de um exercício físico intenso, daí que na minha óptica este é um momento de prazer libidinoso em que a respiração é ofegante e o batimento cardíaco se interpenetram, dando ao momento uma natureza enlevada, supremamente deleitosa e inolvidável… daí que este seja talvez um dos melhores momentos da obra, talvez o melhor, se a minha interpretação estiver razoável é claro… por fim a menção à chuva o que é de sublinhar também como excelsa, brilhante, isto porque acrescenta ao momento aquele tom clássico, pese embora o facto de os clássicos serem umas vitimas da solenidade, da simetria e da abominável pseudo-moral publica, daí a sua obra nunca transparecer a verdadeira emoção, mas sim o que a moral publica lhes permitia…daí que Freud, muito eloquentemente, tenha repudiado de certa forma as compressões dos desejos no subconsciente por força das convenções sociais…sublinhe-se os excessos das Flappers americanas e dos Hippes posteriormente, mas a filosofia freudiana quando bem entendida é muito saudável…

Da tua boca, do teu coração, sai apenas o nome daquele que o leitor desconhece, mas ao dizeres: “Em sangue irrigado nas paredes…” aludes aquela ideia sanguinolenta, porém sem qualquer expressão de violência, é apenas uma forma hiperbólica e disfemista de expressar uma ideia de bradar, de vociferar ou de enaltecer, ou talvez ainda de balbuciar em êxtase neuropático um nome… que ecoa no teu ser como se esse nome fosse já componente do teu próprio sangue, como se fosse ele o teu sangue, o teu “EU”, como se esse eu fosses “TU”, como se em ti houvesse uma dependência poética, despótica, total… de um ser que te anafa de paixão e te mergulha num estádio ébrio de prazer. E depois reiteras o numero de 150/170 min. de facto é um numero significativo, o segundo numero ultrapassa o valor de 2 batimentos por segundo o que é quase uma situação de colapso cardíaco, porém se for só uma hipérbole e não atingir esse valor em termos reais mas tão só em termos figurativos, podemos dizer que é um valor que equivale ao da volúpia, porém eu não tenho a certeza se está associado ao que eu penso que está, pois pode ser apenas o sangue espargido nas paredes por força de um amor patológico e obsessivo por alguém que matas-te…

Terminas “Conseguirá o mundo, nas paredes pintado, guardar-nos como segredo?” será que queres manter uma relação de natureza sigilosa para todo o sempre, longe da curiosidade malsã do povo? Para mim de facto queres manter-te sob a tua relação sob o tecido vestal do anonimato, imaculada, sem qualquer olhar perturbador pelo meio, sem que o dedo de um estranho venha causar trepidação nos alicerces da tua relação, não que ela seja frágil, mas sim porque a sua natureza é sigilosa e fora do sigilo ela perde a sua graça, a magia que a torna mais apetecível, não que o teu amor titânico, digamos mais paixão irascível, cesse com a pressão comezinha de uma sociedade inescrupulosa… acho que esta paixão não cessa todavia, o segredo confere-lhe mais magia, confere-lhe mais primor, porem ainda, na interrogação retórica há já uma duvida quanto à possibilidade de manter essa mesma relação num silêncio intangível pelo olho afinado da comunidade…
A sociedade é como Sauraman do Sr. Dos Anéis, sempre a espreita em busca do anel, por isso muito dificilmente manterás isso em segredo…

O fim é delicioso, se bem entendi (eu que abordo sempre romanticamente as questões) estas a referir-te ao “Coração” em sentido metafórico, pois na minha óptica tal coração, não é o órgão coração, se fosse essa mesma a intenção, a intenção literal, o texto não perderia o brilho imaculado que atravessa toda a sua natureza, mas porém iria contender com a minha interpretação, se tu referes-te ao órgão coração estas na minha óptica só a interpelar se o teu coração poderá ficar sob o toldo das tuas emoções, sob os auspícios dessas emoções que queres só tuas e distantes do cosmos crivado de estranhos, mas a segunda interpretação que para mim é a mais indicada, consiste no prolongamento da metáfora, tornando o coração não só o órgão físico, mas para alem do órgão, a tua paixão e talvez nem haja aqui alusão ao órgão, mas como no principio o órgão (coração) está de tal forma associado ao órgão físico, pois ele bate com base no nome dele, que poderemos considerar uma alusão a ambos…

Bom desculpa-me a sensaboria deste comentário, mas as minhas faculdades de espírito estão (como sempre estiveram) aquém do que é desejável, porém fiz o que pude no momento…

Helder

Raquel Morgado disse...

Helder, é maravilhoso o facto de os meus textos poderem ser alvo dos teus comentários. É absolutamente estupenda a forma como te entregas a eles e esmiuças o mais ínfimo pormenor que eles escondem. Não tenho como agradecer o tempo que me dedicas.